Noite e Dia –
Virginia Woolf
Editora
Novo Século, 2008.
(Night and Day - Publicado
originalmente em 1919)
Esse foi
o primeiro livro da Virginia Woolf que li. Há algum tempo queria ler
algo da escritora, embora só a conhecesse porque costumam comparar o
que Clarice Lispector escrevia com a literatura woolfiana. Sabia que
se tratava de um nome importante para a literatura inglesa,
entretanto, nada mais sabia sobre essa incrível mulher. Sinto
vergonha em dizê-lo, mas é a verdade.
Aproveitei
uma superpromoção no site da Livraria Saraiva e comprei cinco
livros dela de uma vez, por R$9,90 cada. Depois fui entender que se
tratavam de primeiras versões, logo, havia uma série de pequenos
erros de tradução, ortografia e digitação, por isso os preços
estavam tão acessíveis. Como não era nada que comprometesse
seriamente a leitura, nem me importei.
Decidi
iniciar minha viagem pelo universo de Virginia Woolf lendo “Noite e
Dia”, segundo livro que ela escreveu. O título foi o que mais me
chamou atenção. Conhecedores de Virginia provavelmente teriam
recomendado que eu iniciasse por outro romance, talvez “O Quarto de
Jacob” ou “Mrs. Dalloway” ou “Orlando”, suas obras mais
conhecidas – e reconhecidas. Alguns diriam ser uma loucura começar
a lê-la por esse livro, mas foi o que eu fiz. Logo vocês entenderão
o porquê dele não ser exatamente o mais recomendado para viajantes
iniciantes.
Em
primeiro lugar: o livro é grande. Minha edição da Novo Século tem
640 páginas. Isso pode ser desanimador para aqueles não
acostumados. Outro ponto, para quem não conhece a escrita de
Virginia: ela – e se eu estiver falando besteira, por favor, me
corrijam – costuma escrever parágrafos grandes, daqueles que você
precisa respirar fundo antes de começar, do contrário, você perde
o fôlego no meio do parágrafo e se perde. Por último: a história
possui um ritmo mais lento, principalmente no início da obra. Aliado
aos outros fatores acima citados, significa que é preciso paciência
para se aventurar pelas páginas do romance. Em outras palavras, é
desafiador.
Iniciei a
leitura com aquela sensação gostosa – e cômoda – de estar
pisando em terreno familiar. Senti como se lesse um romance de Jane
Austen, ou algo inspirado em seus romances. Aos poucos, porém,
percebi que não se tratava disso. Era enganador pensar que “Noite
e Dia” buscava resgatar os valores vigentes na época de Miss
Austen. O pano de fundo do romance deixa isso claro. É a Inglaterra
do início do século 20, com a aristocracia, a burguesia e a classe
proletária se cruzando pelas ruas cada vez mais movimentadas.
A
personagem principal, confesso, foi o meu grande empecilho. A
senhorita Katharine Hilbery não conseguiu me cativar e, por esse
motivo, abandonei por duas vezes minha leitura. Não pude sentir a
menor empatia por ela, pois nossas personalidades divergiam muito.
Ela parecia tão fria e segura de si... Só no fim do romance é que
fui capaz de gostar, um pouco, dela. Já Ralph Denham, o “mocinho”
da história, me cativou logo no início. Torci por ele do início ao
final, embora tenha me enfurecido com suas atitudes em alguns
momentos.
Preciso
dar destaque a uma personagem que me cativou muitíssimo e que, por
minha vontade, seria a personagem principal: Mary Datchet. Ela é uma
típica mulher moderna: trabalha, vive por conta própria na cidade
(a família dela é do campo), é engajada no movimento feminista e
casamento nem passa por sua lista de prioridades. É uma personagem
forte, que só não tomou o lugar de Katharine porque a autora não
permitiu. Sim, minha admiração por Mary é grande.
Um trecho, para atiçar a curiosidade:
" - É minha terra, esta aqui. Poderia encontrar meu caminho de olhos vendados, só pelo olfato.
E como que para provar, andou um pouco mais depressa, a tal ponto que Ralph teve dificuldade de acompanhar seu passo. Ao mesmo tempo, sentia-se atraído por ela como nunca se sentira antes; em parte, sem dúvida, porque ela era aqui mais independente dele do que em Londres, e parecia firmemente enraizada num mundo do qual ele não fazia parte. Agora, a escuridão espessara a tal ponto que passou a segui-la implicitamente; teve mesmo de apoiar a mão no ombro dela quando saltaram de uma ribanceira para um atalho estreito. E sentiu-se, curiosamente, tímido diante dela, quando Mary se pôs a gritar com as mãos em concha na direção de um ponto de luz que balouçava acima da cerração, num campo vizinho. Ele gritou também, e a luz se imobilizou."
Devo
deixar claro: eu gostei do livro. Mrs.Woolf sabia escrever de uma
forma que te enreda, que te faz querer saber mais. Só que, dentre os
livros dela, "Noite e Dia" não figura entre os mais expressivos. A
própria Katherine Mansfield, escritora contemporânea de Virginia,
não aprovara o romance a priori, por achá-lo muito simples.
Entretanto, mesmo sendo simples, se comparado com os demais trabalhos
de Virginia, "Noite e Dia" não é simplório de forma alguma. Merece
ser degustado como a iguaria que é. Aos leitores de primeira viagem,
recomendo que tente começar por outra obra da escritora. Ou seja
louco, como esta que vos escreve, comece por ele e boa viagem!