sexta-feira, 10 de maio de 2013

Igreja do Livro Transformador


A Igreja do Livro Transformador foi idealizada pelo escritor Luiz Ruffato como uma espécie de brincadeira. A ideia era colher depoimentos de pessoas falando sobre leituras que transformaram suas vidas. O uso da palavra “igreja” remete ao sentido de “união” ou reunião de pessoas que compartilham uma mesma ideia. O intuito de reunir diferentes testemunhos é mostrar como os livros podem mudar a vida das pessoas e incentivar a prática de leitura.


História como leitora

Para não ficar me repetindo, resumirei a minha história como leitora. Quem tiver interesse em saber mais, respondi no final do ano passado uma tag criada pelo canal Estante do Leo falando sobre como minha paixão por livros começou. É só conferir aqui.

Sou uma apaixonada por palavras desde que me entendo por gente. Gostava de copiar as letras e de mexer na estante em que meus pais guardavam os poucos livros que tinham. Sempre os vi com livros na mão. Lembro até da capa sóbria de um livro do Machado de Assis que minha mãe sempre mantinha por perto. Não tive livros infantis, provavelmente porque eles já eram caros e meus pais não tinham como bancá-los, e não recordo dos meus pais me contando histórias, mas cresci lendo gibis da Turma da Mônica, assistindo a TV Cultura e pegando livros emprestados na Sala de Leitura da escola, até finalmente ter os meus próprios livros.


Livros que me transformaram

Adianto que não foi fácil selecionar os livros que me transformaram porque acredito que toda leitura te modifica um pouco, logo, é muito impreciso qualquer critério que você utilize para separar as experiências em mais ou menos relevantes. Em qualquer outro momento, seja passado ou futuro, essa seleção poderia ser diferente. Ah, e me reservo o direito de discordar dos títulos escolhidos poucas semanas depois de publicar esse post.

Harry Potter e a Câmara Secreta – J.K.Rowling.
Seria desonesta comigo mesma se não iniciasse a lista com esse livro. Foi o primeiro da série que li (peguei emprestado do meu primo, anos atrás) e ele foi o responsável pela minha completa paixão e devoção à Harry Potter nos anos seguintes. Também foi ele o responsável pelo desejo de ler séries e de comprar livros. Foi um marco na minha (pré) adolescência e no meu desenvolvimento como leitora.

O Vampiro Lestat – Anne Rice.
Esse livro transformou a maneira que eu escrevo. Na época em que ele veio parar em minhas mãos eu escrevia fanfictions (todo mundo tem seu passado obscuro, não é?) e a narrativa da dona Anne Rice me fez compreender melhor a estruturação de texto e a criação de personagens. Foi o período em que escrevi com mais liberdade. Sinto muita falta disso.

Orgulho & Preconceito – Jane Austen.
O título aqui representa toda a bibliografia da autora. Jane Austen também me ajudou na construção de personagens, porém de uma forma diversa. Compreendi que não é preciso fazer grandes descrições físicas para criar um personagem verossímil, pois são as descrições de sua personalidade, de suas ações e de seus discursos que realmente o sustentarão. Também foi o primeiro livro que reli a cada tradução que me caiu em mãos (comecei com a terrível tradução da Martin Claret, depois fui para a do Lúcio Cardoso na edição de capa de tecido da Abril e finalmente para a da Celina Portocarrero para a L&PM).

Dead Poets Society – N.H.Kleinbaum
Quando houver a Igreja do Filme Transformador, eu com toda certeza farei um testemunho falando do filme Sociedade dos Poetas Mortos. É daqueles filmes que eu assisto quinhentas vezes sem enjoar nunca, porque sempre tenho uma reflexão nova a fazer sobre ele. Amo profundamente os personagens principais, especialmente o Todd, porque me identifico com ele a tal ponto que dói. Infelizmente o livro, escrito com base nos roteiros do filme, não é tão impactante quanto o filme, porém ele me transformou porque foi o primeiro livro em inglês que li. Antes dele eu lera apenas versões adaptadas, pois estava começando meus estudos na língua. Senti-me vitoriosa em conseguir ler algo em língua estrangeira, na íntegra, com apenas dois anos de estudo.

Felicidade Clandestina – Clarice Lispector.
Foi o conto de mesmo nome que me abriu o universo literário de Clarice Lispector. A delicadeza de suas palavras, o constante sentir do mundo e, claro, a paixão da personagem desse conto pelo livro foram argumentos mais que suficientes para me arrebatar. Desde então eu nunca mais fui a mesma. Esse livro também representa todos os outros da autora que já tive o prazer de ler.

Clarice, – Benjamin Moser.
Livro que me despertou o interesse nas biografias. Lembro de tê-lo lido num fôlego só, no primeiro ano da faculdade, por mera curiosidade, e de nunca ter me emocionado tanto com a vida de um autor. Apaixonei-me pela escritora para depois me apaixonar por sua obra.

Passeando com o Rei dos Sonhos: conversas com Neil Gaiman e seus colaboradores – Joseph McCabe.
Selecionei esse livro porque foi por “culpa” dele que eu quis ler mais coisas do Neil Gaiman, especialmente Sandman. Tanto o escritor quanto seus colaboradores falavam com tamanho afeto da série e dos desafios que eles enfrentaram até que Sandman se tornasse o sucesso que é, que não havia como não sentir o desejo de ler os quadrinhos. O livro também foi minha iniciação no universo das Histórias em Quadrinhos, pois eu cresci como uma ávida consumidora de mangás, então eu nada sabia desse universo colorizado de heróis e anti-heróis.

1984 – George Orwell.
Representante de todas as distopias que li, por ter sido o primeiro e um dos mais angustiantes. A ele preciso acrescentar A Revolução dos Bichos, também de George Orwell, e Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, entre outros que também foram representativos, mas não tão impactantes. Esses três livros foram de fato transformadores. Minha visão de mundo mudou e meu senso crítico se tornou mais apurado por causa deles. Fiquei chocada em notar o quão atuais eram as questões ali apontadas. Todos deveriam ler esses livros, para que a nossa realidade se distanciasse cada vez mais das profecias (cada vez mais concretas e acertadas) desses autores.

No mundo dos livros – José Mindlin.
Mais um que representa toda uma série de livros lidos. No caso, esse trata de todos os livros que narram a paixão pelo objeto livro. Foi por causa do senhor Mindlin e da sua loucura mansa que eu finalmente soube que amo os livros e que quero estar profissionalmente envolvida com eles de alguma forma. Esse livro reacendeu a minha vontade de, no futuro, fazer Biblioteconomia e de fazer cursos que me permitam conservar, restaurar e aprender a mexer nos livros.

O fio das missangas – Mia Couto.
Descobrir que há excelentes escritores em língua portuguesa fora do eixo Brasil-Portugal foi delicioso. Mia Couto abriu a porta para que outros escritores de Literatura Lusófona entrassem em minha vida e se acomodassem em minhas estantes. Adoraria ter ao menos um exemplar de cada comunidade falante do português, embora saiba que vários países ainda não têm uma literatura consolidada na língua portuguesa. Quero descobrir mais dessas diferentes visões de mundo unidas por uma língua comum (e por suas enriquecedoras diferenças).

Dom Casmurro – Machado de Assis.
Para encerrar a lista, selecionei um livro que representa o maravilhoso dom da releitura. A primeira vez que li Dom Casmurro eu era imatura demais para compreender a complexidade da narrativa. Lembro-me de ter detestado. Os anos passaram, a faculdade e as leituras ampliaram minha capacidade como leitora, e eis que finalmente criei coragem de reler um dos livros mais polêmicos do senhor Joaquim Maria Machado de Assis. Foi amor à segunda leitura. Mergulhei no texto com ânimo e saí dele com uma visão completamente diferente da que tive em minha adolescência. Sei que ele faz parte dos livros que nos trarão pontos de vista diferentes a cada leitura. Indignei-me com o senhor Bento Santiago e caí de amores por Capitu e sua força como mulher em pleno século XIX. Escreveria uma tese sobre o livro se já não houvessem tantas por aí. Figura com toda certeza na minha lista de livros para a vida.


Se ficaram curiosos com o projeto, visitem o site ou o canal do YouTube para saber mais. Depois, curtam a fanpage no Facebook e gravem ou escrevam seus depoimentos.

Outros depoimentos



11 comentários:

  1. "Ah, e me reservo o direito de discordar dos títulos escolhidos poucas semanas depois de publicar esse post."

    Adorei essa parte!!! Eu sempre me arrependo quando tenho de escolher alguma coisa. Passa um tempo e eu penso que poderia ter feito outra escolha... ahaahaha

    Sobre livros então nem se fala. Tem tanto coisa que eu ainda não li que esse depoimento é totalmente sincrônico.
    (lendo e comentando parte 1)

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    1. Raphael, que deliciosos os seus comentários!
      Eu também mudo de ideia muito rápido quando se trata de listar favoritos. Já li tantos livros bons que me sinto injusta em escolher apenas alguns.
      1984 e todas as distopias lidas em 2012 não poderiam ficar fora da minha lista. Tomei um choque de realidade ao me deparar com futuros tão irreais e tão plausíveis. Queria mais!
      Preciso de tempo nessa vida pra ler tudo que o Mia Couto já escreveu, inclusive os fragmentos que ele deve ter em algum arquivo de computador ou em alguma gaveta por aí. É o escritor com a alma mais sensível que já tive o prazer de ler.
      Mil beijos, irmaozão!

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  2. Que lista, hein? Você falou até de filme transformador! "Sociedade dos Poetas Mortos" é clássico!
    E me lembrou dos distópicos (meu 1o foi "A revolução dos bichos"; depois veio "Admirável mundo novo"; ainda falta o "1984"). E Mia Couto. Sempre citado e ainda não tive a chance de ler nada dele. Mas vou chegar lá...
    bjo

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    1. Michelle, a "Sociedade dos Poetas Mortos" é O filme da minha vida. Muita gente ri da minha cara quando falo isso, afinal há filmes muito mais expressivos por aí, mas foi esse filme meio paradinho e aparentemente banal que me transformou. O amo com todas as forças <3
      Se puder, leia 1984. Mas mergulhe nele duma vez, pra conseguir sair dele o mais inteira possível. Lê-lo aos picados é exercício de tortura psicológica.
      E depois leia Mia Couto pra acalentar sua alma. O homem é uma delícia! Na resenha que fiz sobre "O fio das missangas" eu postei um dos contos dele. Leia. Você adorará!
      Mil beijos e obrigada pela visita!

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  3. Só de ver o título do 1984 sinto arrepios. Assim como vc tenho medo de caminharmos para esse lado. Talvez por saber que ainda é possível que o mundo caminhe para o que Orwell escreve, é que eu tenha tanto medo daquelas palavras.

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  4. Estou cada vez mais fascinado com a literatura africana de língua portuguesa. Quero muito caminhar para as outras literaturas africanas.

    Mia Couto é mais que maravilhoso. Estou lendo Se Obama fosse africano e arrisco dizer que as conferências dele são tão ou mais legais que os romances.

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  5. Que listona !! Ahh que lindo Orgulho e Preconceito aí também coloquei na minha, Jane Austen foi a responsável por me fazer adentrar no mundo dos clássicos que hoje em dia é um dos meus tipos de livros favoritos! E Mia Couto é amor né?!!!
    adorei seu "testemunho"
    bjos

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    1. Ounnn, Melissa! Também adorei o seu! <3
      Mia Couto é muito amor!
      O&P é daqueles livros pra vida, sabe? Bateu uma tristeza, é só ler um pouquinho e o ânimo volta.
      Beijinhos!

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  6. Camila, adorei conhecer os seus livros transformadores! Vários livros que quero ler e alguns que não conhecia, como o do Midlin, vou assistir o vídeo :) e o do Joseph McCabe!

    Dom Casmurro me encantou na releitura... No ensino médio precisei ler uma parte, acabei não finalizando e lembro de ter odiado! Ano passado, li e PUXA, AMEI! AMEI!!! Não sei o por quê de não ter colocado-o em minha lista :( Ele e Orgulho e Preconceito entraram para a lista de livros que quero reler anualmente.

    Eu não lembrava a história do conto Felicidade Clandestina, esse bimestre na faculdade estamos lendo esse livro da Clarice, então na sexta peguei o livro e puxa, fiquei até com vergonha por ter esquecido de um conto que adorei quando o li há alguns anos :)

    Camila, penso em cursar Biblioteconomia também, meu sonho é trabalhar entre os livros, se chegar a trabalhar numa livraria já em sentirei realizada, mas... após concluir essa graduação que amo, vou seguir meu coração que sempre quis estudar "Biblio" :)

    Adorei seu testemunho :D

    Beigos,
    Maura - Blog da /mauraparvatis.

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    1. O Mindlin era um cara muito legal, pelo jeito. Adoraria tê-lo conhecido, mas infelizmente ele se foi antes que a minha paixão por livros eclodisse.
      Dom Casmurro é o livro pra reler e reler. Não o acho bacana de ser trabalhado com adolescentes, a não ser que haja um preparo efetivo pra leitura, coisa que nunca ocorre. Cada livro tem sua época.
      Se não fosse por Felicidade Clandestina, eu jamais leria Clarice. Tentei ler A Legião Estrangeira quando adolescente e detestei. Não conseguia entender o que essa mulher me dizia. Ainda hoje não entendo, mas eu sinto melhor o que ela diz.
      Bora estudar Biblioteconomia juntas, então? x)Seria sensacional!
      Beijoooos e obrigada pelo carinho!

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  7. Que difícil escolher os livros transformadores, não é?
    De fato, grande parte dos livros, dependendo da nossa abertura no período, tem sua cota de transformador.
    "O Vampiro Lestat" é um que colocaria na minha lista também :D
    Não imaginei que pudesse aparecer em outra lista.
    Me instiguei mais pra ler "Clarice," :)
    Agora Mia Couto é um autor que nunca li mas só de ouvir os comentários apaixonados sobre ele sinto que vou gostar ;)
    Abraços,
    Thays

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